LEGÍTIMA DEFESA DA HONRA

Grecianny Cordeiro

Houve um tempo, em que a tese de legítima defesa da honra era reconhecida em algumas situações, por exemplo, no caso de um homem que viesse a matar a esposa porque esta o traiu, ou mesmo, o amante desta. Era a chamada legítima defesa da honra conjugal. Quando levado a júri, o marido traído, dificilmente, seria condenado, afinal, se assim agiu, foi amparado em excludente de ilicitude. Seu comportamento nada tinha de ilegal.

Esse era o tempo em que a honra se lavava com sangue, pois a mulher era propriedade do pai, depois, do marido. A mulher não era sujeito de direitos. Mesmo em caso de violência sexual, esta somente seria vítima se fosse virgem e honrada. O estupro, somente se configuraria se a vítima oferecesse resistência ao agressor.

A mulher conquistou espaços inimagináveis para a geração de nossos avós e, mesmo, para a de nossos pais. A Lei Maria da Penha foi um grande avanço para coibir a violência doméstica, quando então se dizia que, em briga de mulher não se metia a colher. Veio a lei que inseriu a figura do feminicídio, o homicídio qualificado em razão de gênero e, recentemente, a lei que garante a isonomia salarial entre homens e mulheres que exerçam a mesma função. Muitas foram as conquistas.

No dia 1 de agosto de 2023, o Supremo Tribunal Federal julgou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, a ADPF 779, decidindo, por unanimidade, a proibição do uso da tese de legítima defesa da honra para os crimes de feminicídio, como tese absolutória perante o Tribunal do Júri, sob pena de nulidade do julgamento.

A referida ADPF foi interposta em 2021, pelo PDT, visando impedir a absolvição de feminicidas, sob o argumento de terem agido em legítima defesa da honra. Isto porque, pasmem, ainda havia tribunais que referendavam decisões do júri que absolviam os réus, sob o amparo de tal tese! Isso mesmo!

Assim, o STF entendeu que, a despeito da soberania do júri e do direito à ampla defesa, tal tese viola frontalmente o princípio da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero. Desse modo, se usada a tese de legítima defesa da honra, quer na fase inquisitorial ou judicial, todos os atos relacionados ao processo, serão considerados nulos.

A decisão do STF, embora óbvia para os tempos atuais, é necessária, pois vivemos momentos em que, mesmo o óbvio, precisa ser detalhadamente explicado, para não gerar dúvidas.

Que não se tenha mais dúvidas quanto a esse assunto!

Grecianny Carvalho Cordeiro

Promotora de Justiça

https://oestadoce.com.br/opiniao/legitima-defesa-da-honra/ 

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